Os heróis surgiram como ícones, uma inspiração sobre-humana e sem falhas, praticamente como deuses. Entretanto, ao longo do tempo, os roteiristas e autores começaram a explorar um lado mais humano dos personagens, com aprofundamento e principalmente com enfoque na psique deles. Foi a partir disto que grandes sagas surgiram nas telonas e vimos algo similar também nos filmes e séries recentes. A Psicologia dos heróis é muito bem construída e aborda muitas vertentes da saúde mental. Vamos ver algumas dessas abordagens ao longo da história?
Um dos grandes clássicos disso é o dilema do Hulk com Bruce Banner. Banner tem Transtorno Dissociativo de Identidade e isso é muito bem abordado em HQs nas quais o conflito acontece internamente, entre “os Hulks” e Bruce, e principalmente revivendo os traumas da infância, incluindo abuso infantil e a questão da raiva que ativa a radiação gama em seu corpo. Hulk passa por várias fases em que transforma suas personas em uma só e outras em que vive em conflito com elas.
Já Homem de Ferro tem um arco muito pesado, envolvendo alcoolismo, na história “O demônio na garrafa”, de 1979, vemos a luta dele para superar o vício e lidar com os impactos causados por esse mal tão íntimo, inclusive os efeitos na sua vida. O luto é um tema recorrente nas histórias do Batman, seja pela perda dos pais ou ainda de algum membro da bat-família, como “Morte em Família”, de 1988, em que Jason Todd é morto pelo Coringa e Bruce passa a lidar com o impacto de uma perda tão trágica.
“A vida da Capitã Marvel” traz dificuldades e traumas de infância de Carol Danvers e a superação e aceitação desse processo para uma saúde mental em dia. Jessica Cruz é uma “Lanterna Verde” que luta contra ansiedade e traz vários momentos intensos em suas histórias – até sair de sua cama é um desafio, mas ela recebe ajuda para superar e conviver com a doença. Matt Murdock lida diretamente contra a depressão e a raiva, tendo inclusive vários momentos nas HQs bem intensos, a exemplo de “A queda de Murdock” e “Renascido”. Jessica Jones tem pânico, estresse pós-traumático e dificuldades de relacionamento depois de seu tratamento abusivo com Homem Purpura, em que foi aprisionada e obrigada a fazer trabalhos por ele, um estresse traumático que tem grandes impactos.
O Cavaleiro da Lua tem Transtorno Dissociativo de Personalidade e vive intensa luta para lidar com suas quatro personalidades, e um fato curioso é que ele personifica uma antiga crença que acreditava que as fases da lua afetavam psicologicamente pessoas com transtornos mentais. Robert Reynolds, “O Sentinela”, é um exemplo complexo, de dupla personalidade, e sua história aborda temas como depressão, ansiedade e agorafobia, que é o pânico de estar em público.
Esses são alguns exemplos de histórias que destacam a necessidade de acompanhamento psicológico terapêutico. Também conversei com uma profissional da área sobre a importância do uso destes temas e o impacto nas pessoas que acompanham. “Acredito que quando lembramos que até super-heróis sofrem, fica mais fácil nos permitir e reconhecer as nossas próprias dores, entender que pedir ajuda psicológica é um ato de coragem. Entendemos que cuidar da mente é tão importante quanto vencer batalhas”, afirma Sheron Vargas Hoffmann (CRP 07/40818), que tem 31 anos e atende crianças, adolescentes e adultos em terapia.
A arte imita vida, diz o velho jargão, e quando temas tão importantes são utilizados na cultura o impacto é sempre positivo. Vimos boas adaptações nas últimas produções de séries e filmes e isso só reforça o quanto este assunto tem que ser recorrente. Que apesar de heróis, possamos entender que é necessário reconhecer fraquezas e buscar ajuda profissional!
*Andrei Viana é pedagogo e produtor de conteúdos relacionados à cultura geek. Criador do canal do YouTube PadaYou, também participa da programação e realiza a cobertura de eventos do segmento. No Instagram @1padayou, divulga diversos materiais sobre o universo nerd.
